O constitucionalista Vital Moreira discorda da decisão tomada esta segunda-feira pelos juízes do Palácio Ratton, que declararam, pela segunda vez, inconstitucional o diploma que despenaliza a eutanásia. Num artigo publicado no blogue Causa Nossa, o antigo eurodeputado do PS lamenta o “severo rigorismo” com que o Tribunal Constitucional (TC) aborda a matéria.
“Lamento o severo rigorismo com que o TC aborda esta questão, apesar de se tratar de proteger uma liberdade pessoal merecedora de protecção jurídica em vez de repressão penal, ou seja, a liberdade de não ser forçado a viver em condições humanamente insuportáveis, indignas ou degradantes”, defende o constitucionalista, notando que a decisão “se funda num sofisma” sobre “uma alegada indefinição da expressão ‘sofrimento físico, psicológico e espiritual’, quanto a saber se as três referidas vertentes são cumulativas ou se basta uma delas.” E ironiza afirmando: “Julgava ter aprendido na escola primária que ‘e’ quer dizer cumulativo e ‘ou’ quer significar alternativo.”
O constitucionalista argumenta ainda que “se há tantas normas incriminadoras cheias de conceitos indeterminados, deixando a sua densificação aos tribunais, não se percebe porque as normas despenalizadoras os não podem utilizar”. “Devia ser o contrário...”, sustenta.
O TC pronunciou-se na segunda-feira em resposta ao pedido de fiscalização preventiva feito pelo Presidente da República a 4 de Janeiro. A decisão, tomada por maioria de sete juízes contra seis, sustenta que foi criada “uma intolerável indefinição quanto ao exacto âmbito de aplicação” do decreto sobre a morte medicamente assistida e considera que o Parlamento foi “mais além”, alterando “em aspectos essenciais” o diploma anterior.
O tribunal conclui que, ao caracterizar a tipologia de sofrimento em “três características (‘físico, psicológico e espiritual’) ligadas pela conjunção ‘e’ são plausíveis e sustentáveis duas interpretações antagónicas deste pressuposto”, disse o presidente do TC, João Caupers.
Com esta decisão do Constitucional, o diploma regressa novamente ao Parlamento.