Opinião

Taxas, taxinhas e taxetas

Lígia Simões

Os contribuintes portugueses nunca pagaram tantos impostos como em 2022. A carga fiscal aumentou para um recorde de 36,4% do PIB. Segundo o INE, houve um aumento de 14,9% da receita fiscal do Estado no ano passado, para mais de 87 mil milhões de euros. As contribuições sociais renderam mais 10,2%, um aumento justificado pelo crescimento do emprego remunerado, as actualizações salariais e a subida do salário mínimo. As empresas também pagaram mais impostos, com a receita de IRC que aumentou 59,6% (mais 2,897 mil milhões), empurrada pelo crescimento da economia. As famílias, asfixiadas com os juros e inflação, contribuíram mais 12,8% (acréscimo de 1,925 mil milhões) para as receitas do Estado. E os impostos indirectos não foram exceção com a receita a subir 12,2%, com destaque para o IVA, o maior gerador de dinheiro para os cofres públicos, a render 22,6 mil milhões de euros, mais 3,452 mil milhões que no ano anterior.

À excepção do ISP, todos os outros impostos registaram acréscimos nas receitas. Uma tendência acompanhada pelas taxas e taxinhas, contribuições e impostos especiais sobre o consumo de menor dimensão como o álcool e tabaco, que representaram uma fatia de 4,4 mil milhões de euros com as taxas abusivas a evidenciarem um modelo fiscal esgotado que não tem escapado a críticas dos empresários e que até já foi objecto de estudo da CIP. Portugal é o país das taxas e taxinhas, onde são cobradas mais de 4.300 taxas a empresas e famílias, sendo que 2.900 se destinam a empresas públicas. Conclui o estudo da CIP que imperam as novas figuras tributárias, que muitas vezes não têm ligação aos impostos tradicionais, que incidem sobre o rendimento, o consumo e o património - sucessivamente agravadas para garantir fluxos de receitas estáveis e em que muitas vezes são cobradas várias taxas sobre a mesma realidade.

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Sérgio Vasques, deixou recentemente o alerta: desde a reforma fiscal, nos anos 80, com a introdução do IRS, o IRC e IVA, “o sistema tem estado numa lenta degradação”. Tem razão. Estamos a navegar à vista e a fazer remendos atrás de remendos. Não há um Orçamento do Estado sem uma nova contribuição, sem mexidas nos escalões de IRS, com ou sem sobretaxas. E nos momentos de crise a receita política repete-se. Não raras as vezes com o foco nos sectores com maior capacidade tributária - como se viu com a ‘windfall tax’ da energia e da distribuição, com o alegado propósito do financiamento das políticas anti-inflacionistas após a escalada da inflação decorrente da guerra na Ucrânia. Novas contribuições extraordinárias que se juntam às criadas no passado e tendem a ser permanentes, colocando a nu um sistema fiscal sem cabeça, tronco e membros. Pior: como diz Sérgio Vasques, o problema não está apenas na carga fiscal, mas na qualidade daquilo que recebemos em troca. É verdade. Basta olhar para os serviços públicos de Portugal. Desde a saúde, passando pela educação e justiça até aos transportes, o mesmo contribuinte recebe em troca a ineficiência e o esvaziamento dos serviços para os quais paga cada vez mais impostos e chega ao final do mês com menos dinheiro depois de tantas taxas, taxinhas e taxetas. É imperiosa uma reforma abrangente da política fiscal.