Entre a barbárie e a civilização, Portugal escolhe a primeira. Entre a cultura e o vandalismo, o Estado prefere o último.
Esta edição da Feira do Livro de Lisboa, segundo a PSP, terá de ser fechada no sábado às 17h00 porque só assim se garantirá “a segurança, a ordem pública e a integridade dos equipamentos públicos e privados em todo o perímetro de segurança”. Ou seja, a provável festa do Benfica de final de campeonato obriga o certame a cancelar ou reagendar 155 eventos e os editores antevêem uma quebra importante de facturação, num sector que já acumula tantas fragilidades. Mas a questão nem é tanto de natureza material, mas sim de valor simbólico. E, neste campo, soam todos os alarmes.
O futebol é um desporto extraordinário, estratégico, emotivo, mas ganhou um poder abominável na vida pública. Nele se misturam dois elementos explosivos: um negócio milionário e os mais básicos sentimentos tribais. Dinheiro a rodos com comportamentos primários dificilmente pode dar bom resultado. Sobretudo num pais de ética e instituições frágeis. A colossal indústria do “desporto-rei” delapida recursos e valores (disseminando corrupção e tráficos variados), verga o poder político e até o mediático e, pelos vistos, agora até pode engolir outras actividades. Sem espinhas. Ou seja, as claques e as cliques da bola, os hooligans e os grunhos (sim, porque não seriam os comuns adeptos a causar problemas) vão ter primazia sobre os cidadãos e as empresas que estão e já estavam, com toda a propriedade, a tratar da sua vida.
E por que raio é que eu ou o leitor temos de pagar do nosso bolso os agentes para defender vândalos?! Note-se que há escassez de meios na polícia, mas continua-se a tolerar esta fajardice. A que propósito é que as forças de segurança hão-de estar ao serviço do Benfica, do Porto ou do Sporting, garantindo - neste caso, ao primeiro - que pode desfilar nas maiores artérias da cidade e ocupar o centro da capital enquanto quem está legitimamente nas suas actividades é entaipado? O que a autarquia devia garantir é que a Feira do Livro prosseguisse tranquilamente. Repita-se e sublinhe-se: o único motivo para que os festejos no Marquês de Pombal não possam coexistir pacificamente com uma feira no Parque Eduardo VII é que a PSP antevê destruição e confrontos, ou seja, espera que os súcios da bola criem desacatos. E é a eles que é dada prioridade. Pronto. Aqui estamos nós, mais uma vez, a dar guarida a estas chusmas. Assim se continua, ano após ano, a proteger quem merece castigo. E que devia ser banido. Liminarmente proibido. Fim às claques.
Enfim, tudo converge para a questão central: o futebol vive num regime de excepção. Até na covid, o presidente da Assembleia da República apelou a que os portugueses fossem em massa para Sevilha apoiar a selecção, enquanto se fecharam estabelecimentos e se atirou gente para a miséria. Ou o primeiro ministro foi ver o jogo a Munique, deixando montado um circo-cerco a Lisboa. Mesmo nesse período, se um jogador como o Cancelo testasse positivo, o espectáculo continuava, enquanto se um aluno testasse positivo ficava tudo em casa de quarentena (ainda que com testes negativos).
Violência a pretexto do futebol, no futebol (incluindo homicídios), a insanidade ligada ao futebol que banaliza a quebra de todas as regras, normaliza a fuga aos impostos, a escolta policial a turbas de meliantes, a lavagem de dinheiro, os insultos boçais na praça pública e até líderes políticos a colocarem em xeque a sua integridade por causa de bilhetes e em nome de grupos de gangsters (muitos dirigentes desportivos)! A psicopatia da bola provoca um Estado dentro do Estado. Quem dela sofre precisa é de se tratar. E não de receber apoio. Muito menos votos.
Autoteste
Sabe como se mede outro drama da guerra? Quantos dos 38 milhões de habitantes da Ucrânia já abandonaram o país?
Resposta: dez milhões saíram com destino à Europa ocidental e outros 5 milhões procuraram refúgio na Rússia e na Bielorrússia.
Teste rápido
A Ucrânia vai vencer esta guerra quando:
1) receber os Leopard (ah, espera, isso foi em fevereiro...);
2) receber os Patriot (ah, espera, isso foi em Abril...);
3) vai ser agora que recebeu os F16;
4) quando tiver Bakhmut (ah, espera, não conseguiu);
5) parem com a trituradora de carne. Pugnem pela paz.
Antigénio
O PS impediu o depoimento de António Costa na comissão de inquérito à TAP e chumbou outras cinco audições. Mas não era “a verdade, doa a quem doer”, como dizia o primeiro-ministro?
Progénio
Masturbação e sexo oral: o programa espanhol de educação sexual para crianças a partir dos três anos está em tribunal. E ainda bem. Actividades como propor às crianças que se deitem e explorem determinadas partes do seu corpo são criminosas.