Gastos supérfluos e contradições à parte, a polémica em volta do custo do altar da Jornada Mundial da Juventude deve servir de ponto de partida para uma reflexão sobre a concessão de apoios públicos a grandes eventos com a justificação de que os mesmos terão um efeito multiplicador na economia.
Porém, em primeiro lugar, importa referir que o Estado laico não é sinónimo de Estado ateu. O Estado português simplesmente não tem posição em questões religiosas e deve tratar todas as confissões religiosas por igual, independentemente de se tratar da Igreja Católica ou das Testemunhas de Jeová. E se o Estado patrocina grandes eventos culturais, desportivos e empresariais, por vezes com apoios muito significativos (veja-se o exemplo da Web Summit), com o argumento de que os mesmos têm um impacto positivo na economia, porque não poderia patrocinar um encontro internacional promovido por uma confissão religiosa quando aquele promete trazer ao nosso país largas centenas de milhares de pessoas?
A questão não deve ser, pois, se o Estado deve apoiar eventos promovidos por esta ou aquela igreja, mas se o Estado deve apoiar iniciativas deste género promovidas por privados, sejam eles clubes de futebol, empresas de organização de eventos, ONG, grupos de activistas ou confissões religiosas.
Aqui chegados, há bons argumentos a favor e contra o investimento público neste tipo de iniciativas.
A favor temos o impacto potencialmente positivo no turismo e na economia em geral se, de facto, as pessoas que vierem aos eventos acrescentarem algo face à procura turística habitual nessa altura. Podem também ajudar a melhorar a imagem de Portugal no exterior. Mais uma vez, a Web Summit é um bom exemplo disso. Temos também os casos de municípios de norte a sul do país que têm apostado em eventos diferenciadores como forma de atrair visitantes e de se reinventarem. A cidade de Braga, por exemplo, transformou-se, nos últimos anos, num destino turístico de referência muito graças às iniciativas levadas a cabo pela câmara liderada por Ricardo Rio, que hoje vão muito além das festas de São João e da Semana Santa.
Contra o investimento público em grandes eventos temos o facto de não ser fácil medir o seu impacto na economia e o facto de se recorrer frequentemente a ajustes directos, alimentando clientelas diversas e pondo em causa a transparência e a boa gestão dos dinheiros públicos.
Talvez a solução para obter os melhores resultados possíveis, pesando prós e contras, passe por investir em mecanismos de avaliação que permitam estimar a posteriori o retorno por cada euro público que é gasto nestes eventos. A palavra-chave é responsabilização, ou accountability, como dizem os ingleses. Há em Portugal muitas firmas especializadas que podem fazer esse trabalho de avaliação com qualidade. Só não as contratem por ajuste directo!