Opinião

Insanidade é continuar a fazer a mesma coisa, à espera de resultados diferentes

André Pardal


No rescaldo de, mais uma, convenção do Chega, de realçar, por um lado, a habitual postura cínica do PS, a fazer lembrar a forma como Mitterrand “tratou”, em França, a Frente Nacional, do pai Le Pen, nos anos 70 e 80, sabendo que, no curto prazo – o único horizonte que interessa para os socialistas –, será, simultaneamente, o partido menos penalizado com a sua subida, e o seu maior adversário, o PSD, o mais penalizado.

Por outro lado, a forma errática como o maior partido da oposição, o PSD, o vem tratando de há anos a esta parte, parecendo não compreender (não saber ou não querer) a nova realidade política do país.

Para se lidar com o fenómeno, é necessário, antes do mais, percebê-lo.

A “cartilha” não é inédita, nem é – de todo – exclusivamente nacional.

Assente numa liderança carismática, inteligente e astuta de um “chefe” autoritário forjado no comentariado “tudólogo” televisivo, representa hoje, social e politicamente, no nosso país, aquilo que o PCP representou nos anos 70, e até à queda do Muro de Berlim: o voto de protesto de quem está farto, excluído e não percepciona alternativas válidas nos partidos do “sistema”.

Naquele tempo, mais de 1 milhão de portugueses, representantes, no acto eleitoral de 1979, de quase 19% do total dos votantes, não seriam, de todo, comunistas, tal como hoje (e, quem sabe, amanhã) os milhares de potenciais eleitores do Chega não serão todos racistas, misóginos, populistas ou extremistas.

O populismo, seja ele de esquerda ou de direita, ao longo da História, sempre grassou na frustração, na ausência de alternativas válidas e no receio (ou mera táctica) dos moderados.

A ascensão deste partido nos últimos anos traduz, simplesmente, o resultado de três falhanços estruturais.

A saturação e o cansaço relativamente ao sistema vigente, com o desgaste das instituições democráticas, alimentados pela imagem de corrupção, de perfis éticos duvidosos e da desatenção para com grandes franjas da sociedade, onde se incluem todos os partidos e actores com responsabilidade desde o 25 de Abril de 74.

Os excessos radicais da esquerda nos últimos 20 anos, vertidos nos mais elementares aspectos da nossa vida em sociedade, completamente desmesurados em relação ao seu peso eleitoral, em matérias como a educação, a saúde, mas, principalmente, os costumes, com as suas “ditaduras” do cancelamento e do politicamente correcto, perante a apatia da direita democrática.

E, por último, a ausência de reflexão e propostas diferenciadoras do centro e centro-direita nacionais relativamente a tradicionais áreas (em todo o mundo) deste ideário político, em particular nas áreas de soberania, como a justiça, a segurança interna, a defesa ou a política externa. O culto da falta de ideologia, a indefinição e a cópia simétrica do apregoado pela esquerda (vejam-se os recentes processos da eutanásia ou da revisão constitucional) encaminham os eleitores para o “regaço” dos partidos que colocam estas matérias na agenda política, independentemente das suas soluções radicais.

Porque, além de ser o meu partido de sempre, falamos de um partido fundador do regime democrático, assente no reformismo, na moderação e, acima de tudo, na perspectiva (sempre) de liderar o governo do país, em alternativa ao PS, mas também aos extremos, como tem reagido o PSD?

Este partido nasceu contra o PSD, alimenta-se do PSD e nunca será um aliado do PSD (muito mais será do PS e de António Costa).

Ao não rejeitar – liminarmente – qualquer acordo com o Chega, o maior partido da oposição menoriza-se, ridiculariza-se e encaminha, numa qualquer fulgurante via rápida, os eleitores moderados para o PS e para a Iniciativa Liberal, que agradecem.

Vejam-se os recentes casos das eleições brasileiras ou americanas, em que todo o espectro moderado (dentro ou fora dos partidos) se uniu para derrotar Trump e Bolsonaro. Como diria Marx, “a História repete-se, primeiro como tragédia, depois como farsa”.

Há um ano, no consulado de Rio, com respostas erráticas, incoerentes e malabaristas de segunda, como todos sabemos, o resultado foi uma (esta) maioria absoluta do PS. Agora, com uma nova liderança, nas palavras de Albert Einstein, “insanidade é continuar a fazer a mesma coisa, à espera de resultados diferentes”.