Na recente discussão sobre a eutanásia faltou no Parlamento a voz dos conservadores. Dos liberais à extrema-esquerda, todos pareciam ser a favor de algum tipo de lei favorável à eutanásia. Foram poucas as vozes contrárias à lei.
É verdade que o Chega era contra, mas os cheganos são sempre do contra, muitas vezes sem saberem bem porquê. O Chega não tem um pensamento ideológico próprio e chego mesmo a questionar-me se terão algum pensamento digno desse nome. O Chega representa os frustrados; coisa diferente é representar os conservadores.
Acredito que a maioria dos portugueses são tendencialmente conservadores. Somos um povo que não gosta muito de mudanças. Por medo do desconhecido ou comodismo, somos estruturalmente avessos às novidades. Na política, mais facilmente um governo em exercício é reeleito pois, mal por mal, este já é um mal conhecido.
Mesmo à esquerda há muito conservadorismo. Um progressista português é um progressista conservador. O PS faz gala em rejeitar reformas. O nosso primeiro-ministro chegou a afirmar recentemente: “As reformas arrepiam-me.”
Mesmo os partidos mais à esquerda são profundamente conservadores. Tirando algumas causas fracturantes, são sempre contra qualquer mudança, mesmo quando é evidente que o modelo presente não funciona. Caso paradigmático é o do PCP, que defende a Constituição, embora tenha sempre votado contra todas as alterações e revisões que conduziram ao texto actual da nossa “Magna Carta”.
Um conservador é contra as mudanças mas, caso as haja, passa a defender o novo statu quo. Há uma significativa percentagem da população conservadora no sentido clássico: gente ligada à família e a um pensamento cristão de respeito pela vida, de solidariedade, de respeito pelos frutos do trabalho e contra formas forçadas de engenharia social.
Não é necessariamente um seguidismo da Igreja Católica, pois os portugueses são maioritariamente católicos protestantes. Adoram a sua igreja e os seus santos, mas protestam e ignoram as regras pregadas pelos padres.
É nesse vazio que faz falta o CDS no Parlamento. Sempre representou a direita não racista, civilizada, não javarda e dos valores. Os últimos deputados a representá-lo eram gente bem preparada e com uma dignidade que faz falta na representação actual da direita. Disto excluo a Iniciativa Liberal, que tem tido bastante dignidade, mas não cobre o conservadorismo em Portugal e nem se assume de direita.
Este ser ou não ser de direita foi o drama original do CDS. Teve sempre um conflito de personalidade entre a democracia cristã, o liberalismo e o conservadorismo. O fundador dizia estar ao centro e acabou ministro de Sócrates.
Em termos de posicionamento e de comunicação, é impossível comunicar com eficácia e atrair eleitores quando o partido tem dúvidas sobre o que defende. Na comunicação comercial aconselhamos anunciantes a definirem a USP (unique selling proposition), que diferencia um produto de outro. Para a comunicação política é impossível ter uma USP, pois os partidos têm programas com muitas propostas. Mas, na sua essência, um partido deve representar um posicionamento claro na mente do eleitor. O CDS nunca o teve pois, internamente, não conseguia tê-lo.
Há espaço para o CDS. Nas últimas eleições teve mais votos que o Livre e o PAN. Só que foram votos dispersos pelo país e que se perderam. Foi o preço de uma estratégia errada de tentar fazer campanha pelo país todo quando nem em Lisboa estava garantida a eleição de um deputado.
Continua a haver lugar para o CDS. O populismo combate-se com ideias. O populismo é outra forma de engenharia social, com o seu desejo de criar um novo sistema político. Um verdadeiro conservador deve lutar contra qualquer forma de controlo social por parte do Estado, conforme defendem os populistas.
Há lugar para um partido que defende valores que outros partidos não defendem. Há lugar para um partido que defende o crescimento económico mas que se preocupa com que ninguém fique para trás, pois Portugal sempre foi um país solidário. Há lugar para um partido que defende a dignidade do Estado, a soberania e a lusofonia. Mas, acima de tudo, há lugar para um partido em que os eleitores de direita possam votar sem acharem que estão a votar num bando de arruaceiros que farão figuras tristes no Parlamento.