Opinião

A fúria orgânica

Aline Hall de Beuvink


Ia começar por dizer que não ia falar de política, mas vou. Aquele momento nosso e tão culturalmente português, das poucas coisas boas que nos restam, está a acabar. Estou a falar do café. Qual Itália ou Brasil, é em Portugal que o ritual do café tem todo o seu esplendor. Podemos não ter mais nada, mas aquele cheiro de café moído que vem da máquina, cai pela bica numa chávena, que pode estar escaldada ou não, curto, meio, cheio ou em qualquer outra variante, é nosso. Aquele segundo em que o próprio aroma nos faz despertar para a vida e o gosto reconfortante, tão bem conhecido e desejado, o sabor intenso e revigorante entra no nosso ser e percorre as veias, para nos preparar para a vida e os problemas que o governo de António Costa nos coloca, está prestes a acabar. Não os problemas, mas sim o nosso último prazer cafeístico. A Padaria Portuguesa já não tem café à venda, tem uma gosma que apelida de “café orgânico”, porque é “mais saudável, sustentável e processado sem explorar ninguém”. Este último dado nunca é garantido em lado nenhum e duvido que lá o seja. E porque me obrigam a tomar uma mistela que não sabe a nada a não ser a terra, para ser servida numa chávena de design? Eu quero CAFÉ. Não um statement político! E na Delta da Avenida da Liberdade obrigam-nos a tomar café com açúcar mascavado. Nem nos dão a hipótese de escolha. E é isto o que me incomoda: não temos liberdade porque nos impõem uma suposta preocupação com a nossa saúde e criticam-nos - quase fui escorraçada da Delta - por não querermos alinhar ou ceder. E esta atitude totalitarista está a alastrar por aí. Odeio café orgânico, odeio açúcar amarelo, abaixo a pseudomoralzinha verde.