Superjuiz passa a desembargador
Carlos Alexandre subiu na hierarquia dos magistrados judiciais, mas deve manter-se no “Ticão” até ser jubilado.
Carlos Alexandre, graduado em juiz desembargador esta terça-feira, só deixará o Tribunal Central de Investigação Criminal (TCIC) depois de despachar todos os processos que lhe foram distribuídos, confirmou ao NOVO fonte do Conselho Superior da Magistratura (CSM).
Atendendo a que a maioria dos casos judiciais sob sua responsabilidade são de elevada complexidade e que lhe faltam apenas 30 meses para a jubilação, é natural, dizem várias fontes judiciais, que em vez de sair para ser colocado num Tribunal da Relação, o magistrado deverá seguir directamente para casa e gozar a sua jubilação, com a pensão de desembargador.
Com 62 anos – e 38 de serviço –, Carlos Alexandre saiu do anonimato de juiz militar para juiz de instrução criminal no tribunal central onde desembocam os processos mais mediáticos e de maior complexidade. Durante quase duas décadas era o único a despachar processos. De repente, o juiz, que sempre foi uma espécie de “patinho feio” da magistratura judicial, estranho às oligarquias da comarca social, começou a dar nas vistas por colocar atrás das grades figuras públicas, demonstrando uma admirável indiferença às pressões políticas.
Carlos Alexandre mandou prender banqueiros de referência, como Oliveira e Costa e Ricardo Salgado, e políticos que se julgavam intocáveis, como Manuel Pinho e Duarte Lima, e ainda populares figuras do desporto, como Luís Filipe Vieira, sem esquecer os principais arguidos do processo dos vistos gold.
O mediatismo de Carlos Alexandre começou a esvanecer-se quando começou a partilhar o lugar com o juiz Ivo Rosa, em 2016. Também a este foram distribuídos processos muito complexos e mediáticos, como o BES/GES, considerado um dos maiores e mais complexos da justiça portuguesa, tendo-se afirmado o contrário de Carlos Alexandre.
Enquanto este dificilmente aplicava o in dubio pro reo, Ivo Rosa mostrava-se mais benévolo. O choque entre ambos seria inevitável. A ex-ministra da Justiça Francisca Van Dunem acabaria com a polémica: extinguiu o TCIC, enquanto tribunal especializado, fundiu-o com o TIC de Lisboa e colocou mais seis juízes no novo TCIC, que passou a receber processos de criminalidade comum.
Ivo Rosa optou por sair, desgostoso, e ainda por cima com um processo disciplinar, resultante das polémicas com Carlos Alexandre. Foi colocado num Tribunal da Relação, mas impedido de assumir a categoria profissional de juiz desembargador enquanto o processo disciplinar estiver a decorrer.
Agora foi a vez de Carlos Alexandre também bater com a porta. Durante anos, nunca quis concorrer a desembargador. Os seus honorários seriam superiores no TCIC, em resultado do trabalho suplementar a que obrigava a complexidade dos processos, nomeadamente ao sábado. Também fazia muitas substituições, que eram bem remuneradas.
Francisca Van Dunem acabaria por impor que as substituições passassem a ser por sorteio, em vez de serem entregues ao juiz mais velho ou com mais tempo de serviço, tal como acontecia antes. Com mais juízes no “Ticão”, como também é conhecido o TCIC, o trabalho para Carlos Alexandre tornou-se financeiramente menos atractivo. Concorreu finalmente a juiz desembargador e entrou.
A saída para um Tribunal da Relação, provavelmente o de Lisboa, uma vez que está entre os que obtiveram a graduação mais alta, pode, no entanto, não acontecer no próximo movimento judicial, que ocorre normalmente em Setembro. Carlos Alexandre terá de deixar tudo despachado. E há muita coisa para despachar.
Poderá acontecer que se ocupe de processos no “Ticão” nos próximos 30 meses que ainda lhe faltam para a jubilação. Depois vai descansar. O seu nome, no entanto, ficará para sempre na história da justiça portuguesa, com o epíteto de superjuiz.