No incêndio de 15 de outubro de 2017 perdemos 9480 hectares dos 11062 que compunham a Mata Nacional que é o Pinhal de Leiria. 86% do que era a maior Mata do País desfez-se em cinza. Quase tudo.
Deste horror só se esperaria – e, na altura, creio que cada português o esperou – o renascer de uma fénix. Era tarefa que se impunha ao Estado, o proprietário e o responsável pela Mata.
Três anos e meio depois, a paisagem continua desoladora. É tão desoladora quanto a conclusão que podemos extrair da atuação do Estado: pouco mais do que a costumeira negligência, incompetência e indiferença.
Se há matérias difíceis em que se compreende uma resposta mais lenta ou ponderada, nesta não haveria grandes dúvidas: existia uma mata; a mata ardeu praticamente na totalidade; é urgente recuperar e atuar; a falta de ação tem consequências graves.
Pois bem, como sempre, há burocracia, relatórios, comissões, observatórios e recomendações. Árvores é que não.
No mês passado, o Ministro do Ambiente disse que era injusto atacar a velocidade da recuperação porque quase 1200 hectares foram já(!) rearborizados. Uns imensos 13% da área ardida. Ora, se forem necessários 4 anos por cada lote de 1200 hectares, daqui a 32 anos estará tudo concluído. Portanto, os próximos 8 governos que se preocupem.
Mas vá, talvez nem tudo seja para rearborizar. É que disse também o Ministro do Ambiente que “estão a acompanhar a regeneração natural” que já é visível em 1800 hectares. Há aparentemente alguns pinheiros a nascer. Confirmo, já vi uns quantos. Sozinhos. Tristes. Alguém atestou que são suficientes ou basta um pinheiro por hectare? E ainda vamos esperar mais uma primavera pela regeneração natural que, segundo alguns especialistas, já nem sequer acontecerá por esgotada a janela temporal para o efeito. D. Dinis não esperou, D. Dinis lavrou! Mas é o que temos, a habitual indiferença, o permanente rezar pela sorte e esperar que tudo se resolva sem mais. Talvez para o ano já ninguém se lembre, felizmente já não precisamos de madeira para as naus dos Descobrimentos e a erosão do solo está controlada (ah, esperem, não está).
Poder-se-ia pensar que falta dinheiro para atuar, como falta para tudo o que é essencial no País. Contudo, o Estado arrecadou quinze milhões de euros de receita com a madeira queimada num só ano e esperava-se essa receita toda apenas ao final de 30! Bate certo: são os 32 anos que já fechámos para cada lote de 1200 hectares.
Prometeu o Ministro do Ambiente que até ao final da legislatura seria intervencionada toda a área do Pinhal. Em quase 4 anos a intervenção foi curta e sem coordenação local, mas agora é que vai ser! Só que, aparentemente, o previsto nem sequer se refere a toda área ardida mas tão só a 60% da mesma. E grande parte apenas para “apostar” na regeneração ou seja, nada fazer! E o resto?
Como sempre, o resto tem sido “permitido” a associações sem fins lucrativos e privados. A atuar no que é do Estado. Isso não é rezar pela sorte. É rezar pelos privados a fazer o trabalho do Estado. A sorte sempre deu muito trabalho a alguns que, mesmo assim, afirmam, em resposta à proposta do Observatório Técnico Independente, que privados na gestão da Mata nem pensar.
O Ministro do Ambiente afirmou numa visita ao local que “Uma floresta é muito mais do que um somatório de árvores. É um espaço basilar para a diversidade”. Pronto! Já ficámos sem as árvores. Estamos avisados, teremos um pinhal de arbustos, um semi-deserto com diversidade de burocracia, relatórios, comissões, observatórios e recomendações. Eu cá preferia mesmo ter já um somatório de árvores.
*Advogada