A democracia assenta no exercício do poder legitimado dos cidadãos, simultaneamente, na representação e na participação. Em democracia, os cidadãos detêm o poder da escolha livre de quem os representa conservando, ao mesmo tempo, o poder de influência e de decisão sobre as políticas públicas. Um dos elementos-chave da qualidade da democracia é a liberdade de expressão, tanto mais eficaz quanto mais informada e esclarecida. Em democracia, todos têm o direito de expressar livremente as suas opiniões e de participar no processo político sem o risco de retaliações. Da parte dos eleitos existe o dever do compromisso com a confiança conferida através do voto. Este compromisso radica, essencialmente, na obrigação de agir de forma transparente, num contexto permanente de prestação de contas tendo em vista o cumprimento dos programas políticos sufragados, sem perder a distância da centralidade dos princípios e dos valores do Estado de direito.

É neste enquadramento que emerge a questão do sentido de Estado, nomeadamente no que se refere aos deveres e obrigações exigíveis a todos aqueles que exercem funções públicas. Mas, afinal, o que será para a generalidade dos cidadãos o sentido de Estado? Do senso comum é possível extrair a ideia de que as funções de Estado requerem, por parte de quem as exerce, capacidade de decisão e de acção em estrito alinhamento com o bem comum e o interesse geral. No exercício de funções públicas não pode haver lugar a preferências ilegítimas, à parcialidade ou ao livre-arbítrio. Deverá prevalecer sempre o princípio da neutralidade em salvaguarda do interesse público e independente dos interesses particulares ou sectoriais de um indivíduo ou de um grupo. Neste contexto, é indispensável a coexistência de sentido ético, de responsabilidade e de integridade, tendo presentes os impactos que os processos de decisão ou de acção provocam no conjunto da sociedade.

Na prática, este parece ser o guião simples para o exercício de funções públicas, que tem como foco o bem comum, o dever imperativo da responsabilidade, da observância da lei, do contexto ético das decisões e da indispensável obrigação de transparência. Numa democracia madura, escrutinada e aberta não é admissível o desrespeito por estas regras. Acresce que muitas destas regras não estão escritas, mas decorrem dos velhos princípios gerais da filosofia e da ética política. O país precisa que todos aqueles que se dispõem a servir o Estado tenham consciência crítica e distanciamento no cumprimento das suas missões. A confusão entre planos pessoais, políticos ou institucionais conduz, invariavelmente, a rupturas de confiança cujo alcance sistémico contribui para o descrédito e a desvalorização das instituições democráticas e dos seus agentes. O não reconhecimento ou a desvalorização destes aspectos acentua o distanciamento entre eleitores e eleitos e degrada o funcionamento do Estado.