Quando, a 23 de Fevereiro, escrevia para esta coluna um texto com o título “Mensalão”, antevia, com dois meses de antecedência, o que aconteceria neste mês de Abril e como os partidos com assento parlamentar lidariam com a visita do Presidente brasileiro. Passe a imodéstia, não falhei uma. Tudo tem vindo a acontecer como eu prognosticava nesse modesto escrito.

Quase podia usar o velho dito português “eu só não adivinho é o número da lotaria…”. Entretanto modernizado para os números do Euromilhões, é um dito, em regra, sem grande sentido, e menos aplicação ainda ao caso em concreto. Com efeito, a capacidade de previsão, neste como noutros casos, não resulta de qualquer tipo de dotes divinatórios, mas do simples facto de, tendo passado mais de 20 anos no Parlamento, me ser muito fácil perceber a forma como lidam com este tipo de imbróglios.

Isto, mesmo considerando que os tempos são outros e os protagonistas também. Não forçosamente melhores, bem pelo contrário, algo que ouço dizer vezes sem conta, mas que evito reproduzir para não cair naquela conversa que sempre me irritou de “no meu tempo é que era”, por ser uma frase normalmente usada por sujeitos que já passaram há muito o seu prazo de validade, o que quero presumir não ser, ainda, o meu caso. Uma presunção ilidível, como é evidente.

Voltando ao tema, como anunciámos, foi inventada uma sessão especial no 25 de Abril em modo sessões contínuas. O PSD, embatucado, deu o seu aval; o PCP e o Bloco de Esquerda exultaram com a oportunidade de receber um amigo comum (não há muitos) dos seus amigos Jinping e Putin; a IL decidiu ausentar-se; e o Chega procura capitalizar.

O aproveitamento do Chega é, de resto, curioso porque, além da questão relevante da corrupção, o que torna a visita de Lula, nesta data, insustentável é o seu apoio indirecto à agressão russa. Exactamente o mesmo que fazem alguns dos seus amigos das direitas radicais, de Salvini a Orbán. Nesta matéria, extrema-direita e extrema-esquerda confundem-se.

Este prato que Marcelo se lembrou de pedir num momento de exaltação e que Cravinho, inábil, se apressou a anunciar a (Lava) jacto é, de facto, uma verdadeira salada russa apimentada com as inenarráveis declarações de Lula, culpando os Estados Unidos e a Europa pela guerra. Se fosse Bolsonaro…

Lula procura o seu papel num novo movimento dos “não alinhados” que, congregando os BRICS, represente hoje o mesmo que o antigo movimento do tempo da Guerra Fria. Sejamos claros: quando de um lado está um invasor e, do outro, um invadido; quando a luta é entre a democracia e a ditadura, ser “não alinhado” é jogar o jogo dos tiranos. É vergonhoso, como vergonhosas são as tentativas de PS e Governo de darem cobertura a este posicionamento.