Meritocracia corresponde à aceitação de que o mérito individual é essencial para se atingir aquilo que cada um define como sucesso.

Aceitar a importância do mérito individual na vida das pessoas não implica rejeitar que outros factores também contribuem para o sucesso ou falta dele: origens, sorte, heranças, lotaria genética ou mesmo criminalidade. Em Portugal, não é o mesmo nascer em Lisboa ou em Vila Real, Bourbon ou Lopes, branco ou negro, bonito ou feio, homem ou mulher. Por outro lado, no mundo não é o mesmo nascer português ou nepalês. Quando a estes factores juntamos eventos de sorte ou azar (um acidente, um encontro casual, um conflito não previsto…), torna-se claro que são tantos os factores de perturbação que dificilmente duas pessoas exactamente com o mesmo mérito terão exactamente o mesmo sucesso. Até acontece pessoas com menos mérito terem mais sucesso do que pessoas com mais mérito.

Perceber e aceitar isto não implica rejeitar o papel importante do mérito no sucesso. Porque, sendo tudo aquilo verdade, também é verdade que pessoas com as mesmas circunstâncias conseguem, por vezes, níveis de sucesso muito distintos. Herdeiros de grandes fortunas podem mudar o mundo com inovação e filantropia ou desbaratar tudo numa geração. Muitas pessoas nascidas em meios mais pobres mantêm-se aí, mas outras conseguem que os seus filhos sejam da classe média. Não é só o mérito que tem um papel no sucesso individual, mas também é. O impacto do mérito no sucesso individual é uma das boas medidas de liberdade numa sociedade.

Negar o papel do mérito na vida das pessoas é também uma forma de negar o papel que as pessoas podem ter no seu próprio destino. É, no fundo, rejeitar algum sentido para a acção humana. Se tudo é predeterminado pelas circunstâncias, que importância têm as decisões que tomamos, o esforço que decidimos fazer para atingir certos fins? Sem entrar em divagações filosóficas, para as quais não estou habilitado nem teria caracteres suficientes se estivesse, que sentido terá a própria vida se aceitarmos que a acção individual é irrelevante no destino de cada um?

Aqui também entra a própria subjectividade na noção de sucesso. Alguém que se esforça bastante, trabalha mais horas do que deve, chega aos 40 anos no topo da carreira, cheio de dinheiro, mas também de maleitas, terá mais sucesso do que alguém que, optando por outro estilo de vida, tem menos dinheiro e sucesso profissional, mas com mais saúde física e mental? Para alguns, sim, mas, para outros, certamente que não. Existe também mérito em saber escolher o seu critério de sucesso e trabalhar mais (ou menos) para o atingir.

Aceitar a meritocracia como algo relevante na vida das pessoas e na sociedade não implica rejeitar completamente o efeito de outros factores no sucesso. Rejeitar a meritocracia completamente, por outro lado, é também rejeitar a autonomia individual e a liberdade. Uma sociedade será tão mais livre quanto mais meritocrática for, e tão mais meritocrática quanto mais livre for.