Cinco temas da Agricultura e a crise da água: o alerta da CAP aos partidos e ao PR antes do Estado da Nação
Como o NOVO escreveu, Confederação dos Agricultores encaminhou uma carta com preocupações aos grupos partidários, reivindicando atenção ao mundo rural.
A desarticulação e esvaziamento do Ministério da Agricultura e o risco de perda dos fundos europeus são temas em destaque no alerta que a Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) enviou hoje aos partidos políticos e ao Presidente da República. Em vésperas do debate do Estado da Nação, que acontece nesta quinta-feira, e do subsequente Conselho de Estado, o sector alerta para a importância — e o esquecimento — do mundo rural na economia e na sociedade portuguesa.
Tal como o NOVO noticiou neste sábado (leia aqui), os agricultores apelam a que “90% do território não fique esquecido” num momento-chave de diagnóstico e para definição das políticas futuras. Em “cinco questões da agricultura portuguesa e o combate à escassez de água”, alertam para um desígnio nacional que aqui pode ler em detalhe.
“1. O Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) é o documento que estabelece os apoios para a Agricultura Portuguesa no período 2023-27, essenciais para o rendimento dos agricultores e promoção de uma agricultura cada vez mais sustentável, aliando a vertente ambiental como potenciadora da vertente produtiva. Quando da sua discussão pública a CAP afirmou que o PEPAC apresentado, produzido sem uma verdadeira auscultação ao Sector, não respondia às necessidades existentes e desperdiçava a oportunidade de utilizar os mecanismos e os meios financeiros associados a esta Reforma, na promoção de uma agricultura moderna e sustentada. É fundamental que o Governo altere o PEPAC face à má aceitação que o mesmo está a ter junto dos agricultores portugueses e que o mesmo possa ser redesenhado ainda no decurso do presente ano, ouvindo osectorr, para libertar o seu potencial para gerar investimento na agricultura.e induzir uma sua modernização. Tal como está, o PEPAC não é um instrumento de desenvolvimento da agricultura portuguesa.
2. A campanha do Pedido Único 2023 (PU) – ainda a decorrer – e que corresponde à operacionalização do primeiro ano do PEPAC dificilmente podia ter corrido pior. Fruto de um programa desajustado, de uma legislação muito complexa, tecnicamente deficiente e tardiamente produzida, que não assegurou a articulação entre as várias entidades intervenientes do Ministério e ignorou os múltiplos contributos formulados, no PU2023 reinaram o desconhecimento, a dúvida e o atraso, por vezes mesmo a incerteza dos próprios responsáveis pela sua execução. O Ministério da Agricultura, não teve capacidade para dar resposta às deficiências que foram sendo identificadas
Não sendo ainda possível realizar um balanço final da campanha do PU em curso, é imprescindível fazê-lo logo que possível e, em conformidade com o disposto no Pacto para a Estabilização e Redução de Preços dos Bens Alimentares assinado no passado dia 27 deMarçoo com o Governo, agir em conformidade com as conclusões, reprogramando ainda em 2023 o PEPAC, por forma a evitar a contínua penalização dos agricultores em 2024 e anos seguintes.
É imprescindível que os sucessivos adiamentos quanto aos prazos das candidaturas não ponham em causa o recebimento atempado e majorado das ajudas devidas em Outubro, tal com acontece com os agricultores espanhóis e os franceses nossos concorrentes directos. O Governo deve assumir esse compromisso perante os deputados no Debate do Estado da Nação!
3. A desarticulação que se vive no Ministério nunca foi tão visível e palpável, arcando todo o Sector com as suas consequências. A passagem da “Floresta” para o Ministério do Ambiente – que ignora a vertente económica e produtiva desteSectorr- e a integração dasDirecçõess Regionais de Agricultura nas Comissões de Coordenação apenas contribuem para agravar a situação. Apela-se, por isso, a que seja possível introduzir este ponto concreto de discussão no Debate do Estado da Nação, pois esta situação de desarticulação e mesmo desorientação está a ser verdadeiramente penalizadora para todo o mundo rural, que vive momentos de enorme incerteza e imprevisibilidade.
4. No Plano de Desenvolvimento Rural (PDR2020), de acordo com os dados do passado mês de Maio, há ainda 1.114 milhões de euros por executar e 2023 já é o primeiro dos 3 anos de prolongamento que devem servir para fechar o Programa e não para garantir a execução de 19 % do mesmo. Importa assim, e em conformidade com o disposto no Pacto para a Estabilização e Redução de Preços dos Bens Alimentares, assegurar a execução financeira deste Plano, tendo a CAP já proposto várias acções tendo em vista este fim, sem que se verifiquem até ao momento alterações significativas na velocidade de execução do programa, o que é muito preocupante!
5. O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) ignorou completamente a visão estratégica e o pensamento que esteve na sua génese quando reconhecia a agricultura como um sector essencial na recuperação de Portugal e a fatia residual que o programa consagrou especificamente ao sector reflecte, mesmo assim, a opção programática de transformar o PRR num mecanismo de ampliação das disponibilidades financeiras do Estado – quase 40% da Agenda Terra Futura destina-se à renovação de infra-estruturas do próprio Ministério.
A CAP considera que o papel do PRR na recuperação económica e social do País e na resiliência do território ficará muito aquém dos objectivos que presidiram à sua criação e do impacte desejável e necessário, sendo imprescindível introduzir este tema no debate para que seja possível corrigir-se esta situação e alocar verbas que permitam uma maior resiliência do sector agrícola!
O combate à escassez de água, um desígnio nacional, e a necessidade de adoptar medidas de mitigação decorrentes da situação de seca
Sendo a água um recurso estratégico para o desenvolvimento do País, em que os períodos de seca se têm sucedido ano após ano e, num quadro de Alterações Climáticas, serão previsivelmente mais frequentes, de maior intensidade e duração, abrangendo extensas áreas do nosso território, não é admissível que se assista a cada ano de seca como se fosse o primeiro. Não existe actualmente qualquer estratégia para garantir uma solução estrutural para este problema, apenas medidas paliativas, de curto prazo.
Se a água é muito importante para a agricultura, o combate à escassez de água não pode deixar de ser assumido por toda a sociedade, todos os sectores da economia, extensível a todo o território. Deve assim ser assumido pelo Governo e pelo País como um desígnio nacional, que envolva nomeadamente os representantes e agentes da economia real e promova a captação, retenção e gestão sustentável do recurso água.
De igual modo, deve ser adoptada uma política consistente e previsível que permita mitigar os efeitos decorrentes da seca, por forma a que o sector agrícola não fique comprometido para o futuro. É importante comparar com o que se passa actualmente em Espanha, nosso vizinho e principal concorrente, e perceber a dimensão dos investimentos avultados ali efectuados para aumentar a resiliência do sector agrícola no que diz respeito à questão da água. Uma visão prudente desta matéria aconselharia, aliás, a que o nosso país não pudesse vir um dia a ser acusado pelos nossos vizinhos de não fazer os mínimos indispensáveis a uma correcta retenção da água disponível em Portugal.
A CAP havia proposto que o PRR fosse utilizado para este fim. A não ser, importa encontrar o(s) financiamento(s) adequado(s) para financiar esta estratégia de combate à escassez de água, imprescindível e já tardia, e fazer face às alterações climáticas em curso.”