Se não for garantido o conveniente fornecimento dos aeroportos nacionais, Portugal corre sérios riscos de perder competitividade face a outros destinos. Se a proposta da Comissão dos Transportes passar em plenário sem qualquer alteração – e à data em que escrevo este artigo ainda não existem garantias de que assim seja -, as companhias aéreas são obrigadas a utilizar 2% de combustíveis sustentáveis já em 2025, 0,04% dos quais sintéticos, e 6% em 2030, dos quais 2% sintéticos. À primeira vista, pode parecer pouco, mas representa, aos dias de hoje, um acréscimo importante nos custos, o que se repercutirá inevitavelmente nas tarifas aéreas.
O caso português é ainda mais complexo. A companhia aérea nacional, cujo principal accionista é o Estado português, em reestruturação solavancada, continua a acumular prejuízos, tem-se revelado incapaz de acordos com os seus funcionários e há muito abdicou dos aeroportos nacionais, com excepção do de Lisboa, onde tem perdido influência. Adita-se agora um Serviço de Estrangeiros e Fronteiras sem capacidade de resposta ao aumento do fluxo de passageiros, gerando-se o caos num aeroporto há muito sobrelotado e para o qual parece não haver solução – o novo aeroporto, há décadas identificado como necessário, continua num processo de indefinição revelador da incapacidade nacional de tomar decisões.
Os 3,2 mil milhões que serão injectados na companhia aérea, apesar de o serem sob a forma de garantias e empréstimos, deixarão de poder ser investidos noutras áreas de primordial importância para Portugal. Neste ponto, e no actual contexto, é inevitável apontar a por demais notória necessidade de aumentar a capacidade do Serviço Nacional de Saúde. Até como forma de evitar as sucessivas restrições no combate à pandemia, o investimento deste montante na área da saúde seria de capital importância. Um país com uma dívida tão avultada e com enormes necessidades em vários sectores deve ponderar muito bem onde aloca o seu dinheiro, não me parecendo que uma companhia aérea devesse constar no rol de prioridades. Um outro ponto prende-se com o peso da empresa nas exportações e no volume de negócios que gera em fornecedores nacionais. Imaginando que a análise do Governo está correcta, estamos a falar de efeitos gerados por uma TAP com uma dimensão pré-pandemia, com uma grandeza e um volume de negócios a que não terá acesso no futuro mais próximo. O Governo estudou o impacto de uma TAP de dimensão mais reduzida na economia nacional? Com uma diminuição de 18 slots por dia no aeroporto de Lisboa, estamos a falar de 6500 voos anuais a menos – uma redução significativa com implicações não quantificadas e que podem deitar por terra este argumento tantas vezes utilizado pelo ministro.
A última vez que Portugal foi alvo de uma política de transportes coerente e a longo prazo, concordando-se ou não, foi no período de governação de Aníbal Cavaco Silva. Passaram mais de 25 anos e o que temos visto são avultados investimentos em infraestruturas redundantes e de utilidade duvidosa, talvez com a excepção do Metro do Porto e pouco mais.