O esfrangalhamento extraordinário de Liz Truss destrói as fantasias dos nossos liberais do Twitter. Com efeito, a trickle-down economics proposta e logo renegada por um Partido Conservador à deriva comprova os limites do liberalismo fantasista. Aliviar fiscalmente os ricos, em conjunto com a emissão irresponsável de dívida, a ser suportada pelos restantes, é uma impossibilidade. Isto porque, no actual estádio de desenvolvimento das sociedades europeias, é simplesmente impossível estabelecer uma estratégia de crescimento ignorando os custos imprescindíveis dos Estados sociais. E é hoje politicamente impossível desmantelar os Estados sociais. É a realidade que mata a fantasia.
Luís Montenegro completou 100 dias como presidente do PSD. Nestes 100 dias marcou a agenda política, percorreu mais de 40 mil quilómetros ao encontro das pessoas, enterrou qualquer hipótese de referendo à regionalização, antecipou-se ao Governo na apresentação de um programa de emergência social para as famílias, encostou o PS às cordas com o desmascaramento dos cortes dissimulados das pensões e reformas, apresentou uma linha distintiva clara quanto às prioridades para o Orçamento do Estado de 2023 e vinculou o primeiro-ministro a um entendimento nacional quanto ao futuro aeroporto de Lisboa.
Mas importa ter memória. Quando se alçou ao governo, em Novembro de 2015, o PS encontrou o problema da TAP praticamente resolvido. O Estado tinha alienado 61% do capital e, nessa operação, satisfez compromissos internacionais, viabilizou uma empresa considerada de importância estratégica, assegurou a manutenção do hub de Lisboa, assegurou a recapitalização pelo parceiro privado e ficaria com encargos garantidos, em caso de incumprimento, no valor de apenas 615 milhões de euros.
Ora, passados sete anos de governo de António Costa e perante a acumulação de evidências estatísticas e empíricas do nosso declínio colectivo, a manta diáfana da pretensa culpa de Passos Coelho começa a ser cada vez mais curta para tapar esta situação.
A radicalização e a tribalização do discurso político e cultural nos Estados Unidos constituem hoje um progressivo factor de incapacitação do próprio sistema político americano. A verdade é que a América, o grande arsenal económico, político, cultural e militar das nossas democracias ocidentais, encontra-se hoje dilacerada e em luta consigo mesma.
Mas sem fazer uma única reforma estrutural nestes anos, a única marca que se projecta parece ser apenas a da degenerescência do país. A confusão entre o PS e o Estado, em todas as áreas da sociedade. O PS que nomeou um procurador europeu com falsidades no currículo, em detrimento da procuradora escolhida pelas instituições europeias, que afastou a procuradora-geral da República e o presidente do Tribunal de Contas com base em critérios sonsos, mas sectariamente motivados, que respondeu ao caso da tortura e assassínio de um cidadão ucraniano no aeroporto de Lisboa por funcionários do SEF com a nomeação para a direcção-geral do SEF de um boy do gabinete de Eduardo Cabrita e com a trapalhada posterior da extinção encrencada do próprio SEF. O negócio das golas antifumo inflamáveis, que nos chega sempre à lembrança quando o país começa a arder. O mesmo PS que manda no Banco de Portugal, tendo metido lá o seu ministro das Finanças, que ali fiscaliza os seus próprios actos enquanto anterior ministro. E que nomeia como ministro das Finanças o político que os lisboetas despediram em eleições livres.