Uma das questões reiteradamente discutidas é a gestão dos tribunais, abundando opiniões, maioritariamente sem qualquer reflexão e, nessa medida, pouco ou nada contribuem para a discussão e conclusões.

Os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo – art.º 202º/1 da nossa Constituição. O Estado de Direito traz consigo o direito ao Direito, o direito ao juiz e o direito ao advogado, independentemente da jurisdição, da forma de processo e até, urge lembrar, para além do judiciário, dos tribunais, como prescreve a Constituição.

A gestão dos tribunais tem especifidades que devem ser apreendidas.

As funções jurisdicionais, isto é, atribuídas aos tribunais para a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos por lei a fim de decidir uma “questão de Direito” concreta (violação de um direito objetivo ou ofensa de um direito subjetivo), através do conjunto de normas jurídicas existentes à data da violação ou da ofensa, valorando juridicamente o juiz os factos e as provas apresentadas e interpretando as referidas normas.

Faz ainda parte daquela função jurisdicional a tramitação do processo, as decisões intercalares e a gestão do processo concreto nos termos definidos no Código do Processo Civil, ou seja, promovendo os atos legais necessários para que o processo seja célere, justo e cumpra os princípios do contraditório, da legalidade e da equidade.

Esta gestão de um processo concreto, sob a alçada de um juiz, visando uma decisão judicial, costuma designar-se de gestão processual autónoma. Existe, a par desta, uma gestão processual numa definição de objetivos processuais relativa à organização dos processos em geral, que se costuma designar de gestão processual heterónoma.

Não sendo completamente verdade, poder-se-á afirmar que a primeira é da competência exclusiva do juiz do processo e a segunda exclusiva do Juiz Presidente da comarca, dizendo ambas respeito aos processos.

Sucede que o tribunal exige uma gestão para além da gestão processual, passando desde as questões financeiras, a exigir planeamento orçamental e respetiva execução, recursos humanos (designadamente funcionários judiciais) e de equipamentos, manutenção e utilização dos edifícios, segurança dos tribunais, etc.

Esta outra dimensão de gestão tem hoje no sistema legal uma divisão de competências entre o Juiz Presidente e a figura de Administrador Judiciário, sendo que este não tem as competências que deveria, emergindo uma dissolução das responsabilidades e uma ausência de autonomia da função, nem é recrutado através de concurso com exigências curriculares específicas para o efeito.

Nesta particular função de gestão do tribunal, ou seja, à margem da gestão processual autónoma e heterónoma, dever-se-ia ter um gestor qualificado, embora sem se perder a comunicabilidade (que não a hierarquia) entre este e o Juiz Presidente.

Simultaneamente e para a gestão autónoma é preciso não perder de vista a necessidade de contratação de assessores para os juízes. Por último, há que refletir e decidir que o Ministério Público, enquanto magistratura autónoma, independente e hierarquizada, deverá ter instalações condignas externas ao tribunal ou, nos casos em que não seja possível ou enquanto não for, instalações em espaço do tribunal que lhe seja afeto em separado e em exclusivo.

Advogado, consultor JPAB e Bastonário (2017-2019)